"Este é um fenômeno exclusivamente humano, desilusão, acto de desiludir-se, desenganar-se, o que pressupõe que nos enganamos sobre algo ou alguém, que em um momento qualquer, acreditamos.
Por mais doloroso que possa ser vivenciar a desilusão, o processo anterior de nos iludirmos é parte da construção de nossa capacidade de suportar perdas, e de criar mecanismos que nos sustentem para enfrentá-la.
Precocemente, “iludimos” os bebês com o bico, a mamadeira, para que, quando a mãe não possa mais amamentá-lo, ele tolere a perda do seio, da sua presença e de seu olhar constante.
Mais tarde, acrescentamos ao berço, bichinhos de pelúcia, travesseirinhos com o cheiro materno, proporcionando a ilusória presença materna. Muitas crianças, carregam estes objetos simbólicos que lhes dão segurança e proteção, de certa forma mágicos, por toda a infância, adolescência e, alguns os guardam até a vida adulta.
São chamados objetos transicionais, que incluem parte de nossa fantasia vinculada a realidade, ou seja, nos dão um caminho sólido para que possamos suportar a realidade da perda de nossos objetos mais amados.
É um processo de matriz, para enfrentarmos todas as demais ilusões e desilusões que a vida nos reserva no desafio do crescimento e desenvolvimento humano.
Quando adultos e nos apaixonamos por alguém, um manancial de ilusões, esperanças e expectativas toma conta de nossa vida. Tantas vezes, se desiludidos, nos sentimos como bebês a procura do ursinho que vai nos consolar, acolher nossas lágrimas, acalmar nossa magoada e sufocada respiração.
Se temos uma base forte, sobreviveremos. A confiança básica se manterá sólida, nos dará forças e coragem para buscar novas ilusões, fantasias, cada vez mais viáveis e realizáveis. É a aprendizagem pela dor vivenciada, a desilusão experimentada, sofrida mas que nos fortalece.
Esta confiança básica forte, nos permite arriscar, ousar, ir além da mesmice dos medíocres aos quais falta coragem para agir com audácia , temem e fogem do amar pelo simples fato de não sobreviver a uma possível desilusão.
Falo do amar amplo...amigos, colegas, família, pessoas importantes que nos marcaram , e no trajeto de nossa história abandonamos ou fomos abandonados...porque nos desiludimos...porque mudaram mais do que somos capazes de suportar com nosso egoísta desejo, de que todos permaneçam do jeito que nos faz bem, que nos sentimos mais fortes.
Quantas desilusões já tive, quanta dor profunda em minha alma machucada, o desfazer de cada uma delas me fez chorar de dor, decepção, como se nunca mais um pudesse resgatar um outro amor dentro de mim. Eram pessoas que eu amava tanto, admirava tanto, heróis de gente grande...eram parte de meu ser, armas de sobrevivência ganhas por merecimento de um convívio saudável e amoroso.
Como eu investi ! Nestas pessoas, na ilusão iluminada que cada uma me ofereceu em todos os momentos que de mãos dadas sorrimos, ou abraçadas, me senti acolhida e protegida da dor.
Tempos atrás, eu tinha uma galáxia de estrelas ao meu redor, era ingênua, confiante, não havia malícia, todos me pareciam repletos de um sincero afeto por mim, me passavam uma energia celestial, que me impulsionava para o alto, eu confiava profunda e cegamente.
E havia também o grande astro Sol, o maior e mais iluminado amor deste infinito espaço que é um coração apaixonado. Era minha luz de todos os caminhos, espectro convergente de todas os meus desejos e atenções. Energia eletromagnética que me mantinha extasiada em sua órbita , que eu acompanhava incansável e fascinada todos os movimentos, imantadamente atenta a todos os seus desejos.
Pouco a pouco, os desafios que a vida nos exige, faz com que tenhamos de enfrentar a verdade, abandonar a ingenuidade, não nos dá mais a possibilidade de enganarmos-no com ursinhos, fantasias e expectativas inviáveis. Existe espaço para uma única coisa, a desilusão que denuncia a necessária verdade. Sem ela não há crescimento ou amadurecimento. Viver só na fantasia...é um passo para a loucura.
Por toda esta vida, nos desiludimos com as estrelas que criamos a nossa volta para amar, com o Sol que escolhemos para adorar , é a vida vivida apaixonadamente...Em cada desilusão, nasce a possibilidade de um amor verdadeiro."
Fátima Pilla Muller 17/07/2005
Na falta de inspiração... Esta senhora sabe do que fala.